terça-feira, 30 de março de 2010

Radicalizar a luta: um buzinão tamanhão


Os enfermeiros estão fortemente mobilizados para a greve a 100% e dispostos a levar a luta até ao fim, ou seja, até à resolução cabal e definitiva dos seus problemas de licenciados desconsiderados.

Não percebemos que se faça um buzinão, em Coimbra, e à hora que é: 11 horas da manhã. Se for para gastar gasolina e chamar a atenção para os carros que irão andar pela cidade a apitar, muito bem; mas se é para perturbar, fazer mossa, então muito mal.

É elementarmente lógico que o buzinão se faça logo de manhã, a partir das 7 horas até meio da manhã, e depois repetir a partir das 18 até às 20 horas. Seria o pandemónio. E bastaria entupir duas ou três rotundas, a do acesso norte da cidade, Casa do Sal, e as duas rotundas da circular do Hospital Novo, deixando apenas uma via para a passagem das ambulâncias, para a cidade quase parar. Podem ter a certeza que este buzinão seria notícia de primeira página e de abertura dos telejornais.

O mesmo se poderia fazer nas principais cidades do país: buzinões em hora de ponta e nos pontos nevrálgicos de forma a congestionar o trânsito.

Todos os enfermeiros estão dispostos a lutar e esta greve sabe a pouco.

Todos os enfermeiros!? Não nos parece, infelizmente, há alguns que não têm essa disposição, se fizermos fé nas palavras de uma dirigente do SEP, que andou nos HUC no turno desta noite a verificar a adesão à greve (devemos dizer que a adesão nos HUC anda perto dos 100%). Ao entrar num dos serviços, o coordenador do SEP, Paulo Anacleto, foi confrontado com a questão: porquê não “greve por tempo indeterminado”? A resposta, como tem sido habitual, foi: “é ilegal!” Mas perante o retorquido pelo colega: “Não! Nunca encontramos isso em lei que fosse, e a minha esposa é advogada e também é de opinião que se pode fazer greve por tempo indeterminado!” Perante tal, Paulo Anacleto ficou mudo e a referida colega sindicalista não conseguiu conter-se: “Greve por tempo indeterminado ou por duas semanas, eu não faço! porque tenho uma casa a sustentar”.

E isso: os sindicatos não ousam radicalizar a greve porque os seus dirigentes têm uma casa para sustentar. E os restantes enfermeiros, a grande maioria dos enfermeiros não têm?!

Uns enfermeiros muito pouco compreensivos


O secretário de Estado da Saúde, o sr. Pizarro, veio à televisão dizer que os enfermeiros é que não quiseram aceitar o “aumento” para os 1200 euros e não “querem compreender” as dificuldades do país ao não aceitarem o aumento faseado. Bom, fica-se com a ideia de que os enfermeiros estão a pedir algum favor ou alguma que não é sua por direito. São muito pouco compreensivos!

Os sindicatos até estão a pedir pouco, talvez seja esse o mal. Porque se estivessem a pedir o exactamente CORRECTO e JUSTO, então a remuneração como licenciados deveria ser a partir do momento em que cada enfermeiro tirou a sua licenciatura, ou seja, com RETROACTIVOS!

Mas nem isso estamos a reivindicar, somos modestos demais e, talvez por isso, venhamos perder se não persistirmos na luta – pusemos a fasquia muito baixa e acordamos também muito tarde. Não é de estranhar, as reivindicações são um pouco como as formas de luta estabelecidas pelas direcções sindicais: pouco ambiciosas.

Não é demais recordar – haverá colegas mais novos que eventualmente não saberão – a greve feita em 1976 e que permitiu a promoção dos antigos auxiliares de enfermagem, foi uma greve dura, greve a todos os actos de enfermagem, com excepção das urgências, incluindo administração da medicação. Era ver a figura patética de médicos a preparar e administrar soros e a tentar fazer a higiene a doentes acamados. Quando se decidiu avançar para a greve total, incluindo urgências, é que então o Governo cedeu. Não houve outra alternativa. E o país, é bom também frisar, estava pior do que agora: não tinha dinheiro e nem havia crédito sequer.

Face à demagogia do PS no Governo, devemos teimar e levar a luta até ao fim. Porquê não radicalizar a luta como em 1976?

Quanto ao sr. Pizarro, devemos esclarecer que, segundo contas feitas, a despesa com os enfermeiros a auferir como licenciados, como realmente são, irá ter um acréscimo de custos para o Orçamento de Estado de pouco mais de 140 milhões de euros por ano. Ora, só o orçamento para a Assembleia da República é, para este ano de 2010, de mais 190 milhões de euros, isto é, mais 50 milhões de euros. Propomos que os deputados da Nação, e já que a sua missão é a de servir o país – uma função altamente desinteressada e altruísta –, então que passem a ganhar como os enfermeiros ganham actualmente (um enfermeiro graduado com 20 anos de serviço recebe 1300 euros ilíquidos mensais), passem a comer em refeitório de funcionários públicos (3,8 euros por refeição) e tenham direito a reforma após 40 anos de serviço e 65 de idade (tal como um “normal” funcionário público), e teríamos o problema resolvido para os enfermeiros sem aumento de custos para o OE, porque 50 milhões de euros, atendendo ao que fazem, são mais que suficientes para pagar aos nossos “representantes”.

Fica a sugestão!

quinta-feira, 18 de março de 2010

A “Greve da Páscoa”


Perante a intransigência da ministra, a srª drª Ana Jorge, a CNESE resolveu entregar pré-aviso de greve para os dias 29, 30, 31 de Março e 1 de Abril, a fim (presumimos) de pressionar (ponto 1) o Ministério da Saúde a apresentar a sua “Contraproposta Global e Integral de Projecto de Diploma” no que respeita a grelhas salariais e transições relativo, como é lógico, à Carreira Especial de Enfermagem, que é, diga-se em abono da verdade e dos interesses da grande maioria dos enfermeiros do SNS, muito pouco lógica.

À primeira vista, muitos enfermeiros julgaram que se iria fazer greve por 4 dias, tinha-se assim endurecido a greve anterior, que ocorreu durante 3 dias. Mas não, pura ilusão. A greve (partindo do princípio que será para se fazer, entretanto poderá haver acordo, nunca se sabe!) será apenas de 2 dias e 2/3, porque iniciar-se-á às 14 horas do dia 29 e terminará às 8 horas do dia 1. É obra, esta nem ao Diabo lembraria! É original, gostávamos de conhecer as mentes brilhantes que se lembraram de fazer uma greve que dura pouco tempo, mas parecendo que vai durar o dobro. Temos, nos sindicatos, bons ilusionistas.

Estamos bem lembrados. Ainda decorria a greve de Janeiro e não se sabia bem a resposta da ministra, e o SEP ameaçava com greve nos blocos operatórios por várias semanas, comprometendo-se, desde logo, a criar um fundo de greve a fim de apoiar esses colegas. Entendia-se que este tipo de greve segmentar seria mais danoso para as finanças dos hospitais epes e quejandos. Afinal, foi só fumaça! Anda-se agora para trás, não só porque são menos dias de greve como o período para onde é marcada, semana anterior à Pascoa, vai retirar aderência (muitos colegas estarão de férias) e terá menos impacto na opinião pública. Fica-se com a sensação de quem tem medo dos enfermeiros não é o Governo, mas os sindicatos.

Não se compreende que o SEP convoque uma manifestação de “jovens enfermeiros” para o dia 26 de Março, enquadrando essa iniciativa nas manifestações mais gerais da juventude trabalhadora levadas a cabo pela CGTP, e não mobilize, ainda mais massivamente, uma manifestação de TODOS os enfermeiros, como aconteceu em Janeiro, e que deu a conhecer a uma boa parte da opinião pública, que ainda desconhecia, as verdadeiras razões da luta dos enfermeiros.

Apesar desta estratégia do caranguejo, apelamos a todos os enfermeiros que façam greve. E mais ainda, denunciem publicamente (e também aos sindicatos) todas as tropelias feitas pelas administrações e chefias durante os dias de greve. Nos HUC e no Hospital de Santa Maria, houve chefes que obrigaram que os cuidados mínimos fossem assegurados por um número superior ao dos enfermeiros que asseguram o turno da noite. Nos HUC, aconteceu num dos serviços de Medicina sem que os sindicatos tivessem actuado, dando a entender que os chefes não chateiam chefes, porque, para quem não saiba, são os chefes que se encontram em maioria na Direcção Regional do SEP e foram eles que, maioritariamente, constituíram o piquete da greve. Quanto ao SIPE, este não passa de um sindicato fantasma.

Se a ideia dos sindicatos é desmobilizar os enfermeiros para depois, falsamente, responsabilizá-los por aquilo que vierem a aceitar do Governo, que se desiludam. Contra ventos e marés, chefes e fantasmas, a grande massa dos enfermeiros irá fazer greve na semana da Páscoa, demonstrando que, por eles, a luta não terminará enquanto as suas mais que justas reivindicações não forem satisfeitas. Pouco nos importa se o Governo e a ministra apresentam ou não a sua denominada (pelos sindicatos) “Contraproposta Global”, desde que aprovem, para já, a proposta dos sindicatos quanto a grelhas salariais, transições e rácio para Enfermeiro Principal. E o resto depois se verá!

PS: Por que carga de água alguns blogs souberam do pré-aviso da greve primeiro que os sócios do SEP?

Assinatura do CCT para o sector privado: um mau agoiro!


O SEP (Sindicato dos Enfermeiros Portugueses) assinou com a Associação Portuguesa de Hospitalização Privada (APHP) o Contrato Colectivo de Trabalho (CCT) que irá vigorar pelos próximos 3 anos e abrangerá os cerca de 3500 enfermeiros que trabalham nas 45 empresas que se dedicam ao serviço da saúde privado. Se não fossem certas particularidades que, inevitavelmente, irão ter reflexo no processo em curso de aprovação da nova carreira para o sector público, não daríamos ao trabalho de escrever estas linhas.

A primeira particularidade é a data em que foi assinado este contrato: 8 de Outubro de 2009. No entanto foi publicado no Boletim do Trabalho e Emprego de Janeiro de 2010 (nº1) e só agora foi conhecido porque foi dado a conhecer pela referida APHP no seu sítio da Internet; por parte do SEP foi guardado prudente silêncio. Por que terá isso acontecido? E porquê assinado apenas pelo SEP? São as primeiras perguntas que se põem.

Passando rapidamente os olhos pelo clausulado do CCT, retém-se alguns dados dignos de interesse e de questionamento. Logo a seguir: o período normal de trabalho semanal para o sector privado é de 40 horas, período que pode ser prolongado para as 60 horas; assim como o horário diário de 8 horas pode ser prolongado para as 12 horas. Claro que se pode invocar que o trabalho de enfermagem em unidades de internamento reveste características particulares, mas para quem tem criticado o Código de Trabalho por ser um documento contra os trabalhadores, podemos dizer: com representantes dos trabalhadores como estes, os patrões serão pessoas felizes.

Terceira particularidade diz respeito à “mobilidade funcional” (Clausula 27ª) e “local habitual de trabalho” (Clausula 28ª), que se prolonga nas três cláusulas seguintes, que permite ao empregador, “quando o interesse da empresa o exija”, encarregar o enfermeiro de exercer funções “não compreendidas na actividade contratual”, ou seja, pô-lo a fazer tarefas que nada têm a ver com a enfermagem: a denominada flexibilidade, tão excomungada pelos sindicatos, especialmente os afectos à CGTP. O mesmo sucede com a mobilidade, também execrada pelos sindicatos (e com razão): o enfermeiro pode ser deslocado para outro local de trabalho, desde que não seja superior a 40 quilómetros do local original e igualmente no “interesse” da empresa.

Quarta particularidade: o trabalho nocturno é remunerado com o acréscimo de 25%, sendo considerado “trabalho nocturno” o trabalho entre as 23 horas de um dia e as 8 horas do dia seguinte. Claro que se poderá alegar-se que é o sistema generalizado no sector privado, mas dá argumentos a que o mesmo seja aplicado em breve na Função Pública. A tarefa do SEP seria contrariar esta disposição, como em todas as anteriores, mas não o fez.

Mas “melhor” ainda: são instituídas 4 categorias de enfermeiros: Enfermeiro Interno; Enfermeiro; Enfermeiro Sénior; Enfermeiro Perito (correspondendo ao Especialista). Categorias que terão os seguintes salários mensais, respectivamente: 900 euros; 1075 euros; 1300 euros; 1676 euros. Ora aqui é que se encontra todo o busílis, quem aprova uma grelha salarial destas e ainda antes da aprovação da grelha salarial para a Função Pública (FP), estará disposto a aprovar qualquer coisa para os cerca de 39 mil enfermeiros do SNS, desde que envolva algumas migalhas, ou nem isso. Tem sido norma os salários e os aumentos (agora, os congelamentos) na Função Pública servirem de referência para os salários e aumentos para o sector privado, mas, ao que parece, o SEP, que até se considera um sindicato de “esquerda”, quis ser original e entendeu fazer o contrário.

Perante um CCT destes, podemos nós, enfermeiros da FP, colocar já as barbas de molho, porque os indícios são de muito mau agoiro quanto ao que aí virá (como ou sem a “greve da Páscoa”).

quinta-feira, 11 de março de 2010

Afinal, quem é que deu o tiro no pé?



A greve não é um fim em si, mas um meio para atingir um objectivo e que nos é imposto pela intransigência deste governo que, por sinal, até é minoritário e deveria, a princípio e segundo as contas dos partidos de esquerda da oposição parlamentar, ser mais pressionável. Mas a realidade ensina-nos que este é o único meio que o governo autodenominado de socialista nos deixa, a nós, enfermeiros.

A mesma realidade, infelizmente, tem-nos dito que quem tem mais medo desta forma de resolução dos nossos problemas, de trabalhadores por conta de outrem, são precisamente os nossos sindicatos. No entanto, de quando em vez, dão uns ares de valentões: foi em 03/12/2009, com a FENSE que “ameaçou” o governo caso as negociações não avançassem, claro que o governo disse népias; ultimamente, foi a CNESE com o “ultimato” para que o governo apresentasse contraproposta de grelha salarial e fundamentação da já famigerada Lei 12/A de 2008. São atitudes que servem para disfarçar.

Quando se quer atacar o adversário de forma a vencê-lo, não se avisa – é o óbvio. Quando se andou a convocar vigílias para junto do Ministério, em vésperas de eleições, andou na net uma campanha de envio de SMS para a Guadalupe (SEP) a pressionar a convocação de “greve por tempo indeterminado”. Na concentração de 18 de Setembro, foi patético assistir aos argumentos invocados pelo José Carlos Martins para explicar a incorrecção e inoportunidade deste tipo de greve. Mais tarde é que conseguimos perceber o porquê da argumentação, é que estava em curso a assinatura pelos sindicatos do acordo da carreira (pobre e triste para a classe), logo publicada a 22 de Setembro.

Não percebemos (fazemos de conta) o argumento da “ilegalidade” da “greve por tempo indeterminado” invocado por alguns colegas, incluindo sindicalistas (SEP), já que o Sindicato dos Enfermeiros marcou greve por tempo indeterminado às horas suplementares para os enfermeiros do Hospital de Braga, e já que o artigo 602ª do Código do Trabalho é claro quanto ao terminus da greve, ela acaba quando quem a convocou o entender, assim como a greve convocada para um certo e determinado número de dias, poder ser sempre prorrogada por períodos sucessivos de forma indefinida, sem ser necessário a entrega de novo pré-aviso.

Mas, quando não há vontade, todos os argumentos são válidos para se ficar na imobilidade, isto é, bem longe de novas greves, que a partir de agora teriam de ser mais duras. Não devemos estar longe da verdade que, na enfermagem, e por vontade dos sindicatos, não haverá mais greves nos tempos mais próximos, pelo menos no que toca à nova grelha salarial, transições e rácio para a categoria de Enfermeiro Principal. O cozinhado deve estar, neste momento, em adiantado estado de cozedura.

A FENSE, em comunicado datado de Janeiro, véspera da greve, “reivindica”, no ponto 2, o “Descongelamento e pagamento de escalões de progressão…”, e a CNESE, para não ficar atrás, em comunicado de apelo à greve da FP no dia 4 de Março, no seu ponto 1, “reivindica” “Pelo descongelamento de Escalões”, só que nenhuma delas diz que esta sentida e justa reivindicação não consta da ronda actual de negociações. Há muito que os sindicatos deixaram cair o descongelamento dos escalões da actual carreira, reivindicação que deveria ter sido apresentada no início de 2008, quando o Orçamento do Estado desse ano contemplava verbas para o efeito. Porque quiseram utilizar esse tempo de congelamento (há colegas que não sobem de escalão há oito anos devido a esse medida do governo) como moeda de troca na negociação da nova carreira, e o resultado está á vista.

Acontecerá que, mesmo se a proposta de subida de 490 euros para todos os enfermeiros licenciados (como sugere a CNESE) seja aprovada, muitos enfermeiros não receberão mais dinheiro se a carreira se mantivesse como está e o descongelamento fosse feito. Os sindicatos, em relação a esta reivindicação, que teve o apoio imediato de uma grande parte de enfermagem, andam agora à rasca com a eventualidade dos enfermeiros entrarem com processos em tribunal a fim de serem recolocados, como têm direito, na actual carreira. Caso isso aconteça, e em massa, não só os sindicatos ficam com a careca à mostra em relação ao que aconteceu há 2 anos, como teriam dificuldade em explicar as negociatas em curso, ou seja,a fraca grelha salarial que estará, a esta hora, já meio aprovada. Quem deu um grande tiro no pé foi, sem dúvida, os sindicatos.

sábado, 6 de março de 2010

Uma ministra muito amiga...


O Governo vai aumentar o preço dos medicamentos, embora de forma indirecta, com a alteração do regime de comparticipação às farmácias. Serão estas as principais beneficiadas, que verão também a reposição da sua margem de lucro nos anteriores 20%, e a dos distribuidores grossistas em 8%. Estas margens de lucro tinham sido diminuídas para 18,5% e 6,9%, respectivamente, por medida do anterior ministra da saúde, Correia de Campos. Com esta ministra, a médica Ana Jorge, os vendedores de medicamentos em Portugal esfregam as mãos de contentes.

Para disfarçar e manifestando a demagogia habitual, o Governo “socialista” veio com a história de que o novo regime de comparticipação de medicamentos vai fazer poupar aos cofres do Estado cerca de 80 milhões de euros, só que diz metade da verdade. A outra metade é a de que o novo sistema de comparticipação é vago e omisso, deixando nas mãos dos médicos a possibilidade, ou não, de prescrever o medicamento genérico mais barato, e só neste caso é que haverá poupança para o utente (doente/consumidor). Mas como grande parte dos médicos encontra-se fortemente influenciada pela propaganda médica e pelo aliciante dos congressos em paraísos turísticos e outras benesses irrecusáveis, a prática será a continuação de se receitar medicamentos de marca, e aí a conta será mais elevada.

E no caso dos utentes possuírem receita de medicamento genérico mais barato, muitas farmácias não possuem à venda os genéricos mais baratos e, naturalmente, irão querer impingir medicamentos mais caros e assim aumentar os seus lucros. O Objectivo de qualquer comerciante é enriquecer, não vai ganhar 100 se pode ganhar mil, e a prova desta ganância por parte dos proprietários das farmácias está no facto de até agora, apesar da medida ter sido aprovada há já alguns anos, nenhuma farmácia disponibilizar ainda a venda por unidose, sistema que iria evitar desperdício e poupar alguns milhões de euros ao cidadão.

Mas o engraçado desta história de alteração do regime de comparticipação dos medicamentos e do aumento da margem de lucro das farmácias (coitadinhos dos proprietários que estavam a ir à falência!) é o facto da ministra da Saúde, tão parca em reconhecer os direitos dos enfermeiros como licenciados, estar metida neste negócio de favorecimento às farmácias e laboratórios farmacêuticos – não nos esqueçamos que estas multinacionais é que estão a montante de todo o negócio do medicamento e são elas que mais lucram, bem exemplificado na história da “pandemia” da Gripe A –, num esquema de tráfico de influências, entre o presidente da ANF, João Cordeiro e Armando Vara, dirigente socialista, agora revelado através das escutas feitas aos intervenientes do caso “Face Oculta”.

Num país em que a factura do SNS com comparticipações em medicamentos ascendeu a 1586 milhões de euros, em 2009; onde, com estas medidas, as farmácias irão embolsar mais 50 milhões de euros, por ano, e os distribuidores mais 30 milhões; com um modelo biomédico de cuidados de saúde que, por sua vez, incentiva o consumo de medicamentos que, por curiosidade, até são dos mais caros da União Europeia; temos uma ministra muito amiga dos empresários do negócio das farmácias e dos grupos multinacionais farmacêuticos; mas, pelos vistos, muito pouco amiga dos trabalhadores por conta do Estado, que são os enfermeiros. E ficaram os sindicatos todos satisfeitos com a recondução desta médica no cargo de ministra; com “amigos” destes, os enfermeiros não precisam de inimigos!

terça-feira, 2 de março de 2010

A estratégia do empata


O Governo/ministra da Saúde veio, na reunião de26 de Fevereiro, empatar mais uma vez, agora com a argumentação de que a Lei nº 12-A de 2008 tem de ser respeitada em tudo o que diga respeito à carreira/grelha salarial da Enfermagem e, perante esta posição ministerial do empata, os sindicatos, concretamente os da CNESE foram para casa arranjar refutação aos argumentos que lhes foram apresentados e provar que a referida lei não é uma “lei de valor reforçado”, ou seja, “qualquer acto legislativo (decreto-lei, por exemplo) posterior não está, constitucionalmente, obrigado a dela não se desviar”.

Eis o cerne da questão! Eis a razão por que a negociação sobre a grelha salarial e outras questões que se prendem directamente com a carreira não andam nem desandam! Afinal, foi preciso tanto tempo para se chegar à questão essencial! Por que é que a ministra não falou nesta questão logo na primeira reunião? Chegou-se a uma situação verdadeiramente patética, de cuja responsabilidade os sindicatos não se podem eximir. Estamos de acordo com um colega que num blog sugere que, na reunião do próximo dia 16, os nossos queridos representantes sindicais levem o chazinho e uns bolinhos e confraternizem.

Não sabemos bem se devemos chorar ou rir, já que esta representação trágico-cómico está a assumir proporções elevadas. Os sindicatos continuam a deixarem-se levar por argumentação falaciosa. As leis fazem e desfazem-se da mesma maneira, e respeitam-se ou furam-se consoante os interesses. A tal Lei nº12-A/2008 vale o que vale, se não valeu para os professores e muito menos valerá para os médicos, também não vale para os enfermeiros. E, mais importante, se a Lei foi aprovada e está a ser aplicada na prática foi porque os trabalhadores deixaram, tendo confiado essa luta aos sindicatos. Deve-se lembrar que os sindicatos dos trabalhadores da Administração Pública não quiseram, não souberam e não persistiram na luta contra esta e outras leis que o PS fez contra os que trabalham. Deve-se apontar o exemplo dos trabalhadores e dos jovens franceses, aqui há alguns atrás, que fizeram manifestações quase diárias contra uma famigerada Lei, denominada Contrato do Primeiro Emprego (CPE), que consistia em criar mão-de-obra quase gratuita para os patrões, até que o CPE foi revogado pelo Parlamento. Mas foi a luta dos trabalhadores que a isso obrigou!

Mas, ao que parece, falta aos nossos sindicalistas, pelo menos aos que dão a cara, coragem, espírito de persistência e vontade de agarrar o touro pelos cornos. E isto quer dizer que muitas ameaças de luta não passam de bluff, temos quase a certa que a ameaça de se fazer greve nos blocos operatórios, ainda decorria a greve de Janeiro, foi exactamente isso: uma gabarolice. Quando se quer tramar o adversário, nunca se deve ameaçar, porque estamos a avisá-lo do que vamos fazer, e assim permitir que ele se possa defender. A estratégia correcta é dizer só na altura o que se vai fazer, e agora é marcar já uma greve de cinco dias, com a constituição de um fundo de apoio aos grevistas. Fundo que já devia estar a ser constituído, o que prova que a ameaça da “greve dos blocos” foi exactamente um bluff. Greve por cinco dias, e já!

Não vamos falar, pelo menos por agora, de greve por tempo indeterminado, mas é uma hipótese a considerar; e não venham com a treta de que não há suporte legal, porque há, basta consultar o Código do Trabalho. Mas que se avance para a greve por cinco dias, com realização de nova manifestação. No entanto, sabemos que os nossos dirigentes, antes de decidirem da greve, irão perguntar aos partidos onde militam se é oportuno ou não (para os interesses desses partidos, entenda-se) a realização de uma greve numa altura destas em que se procede à discussão e aprovação do Orçamento do Estado na especialidade. E o nosso problema, infelizmente, também aqui entronca; é que a nossa grelha salarial/carreira/etc será o que os partidos da oposição acordarem com o Governo a troco de deixarem passar o OE-2010. Estamos reféns de jogos de interesses entre partidos e temos que saber ultrapassar esse escolho. É bem provável que a nossa luta passe ao lado dos sindicatos, caso estes continuem na estratégia do empata. Também ninguém nos garante que não haja já alguma coisa mais ou menos alinhavada entre sindicatos e Governo; devemos recordar que os jornais, a propósito do acordo dos professores, já sabiam, à hora do fecho da edição, o que seria assinado (e acordado) três a quatro horas depois!

A estratégia do empata é geralmente usada quando se pretende assinar o que se diz não se querer acordar. E os sindicatos dos enfermeiros estão a jogar abertamente nesta estratégia.