segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Enfermeiros, uma classe dividida

 

Os sindicatos da UGT resolveram convocar uma greve para esta semana, 11 a 15 de Setembro, a fim de defesa de criação da categoria de "especialista" na carreira, reestruturação da dita, atualização da tabela salarial, aumento dos vencimentos, estes últimos congelados desde 2005, pelas 35 horas para todos os enfermeiros independentemente do tipo de contrato - é bom relembrar que foram os sindicatos que ajudaram a retirar da carreira, dita "nova" a vigorar a partir de 2010, a categoria de "especialista" a troco do título de "doutor". O SEP, o maior sindicato dos enfermeiros e, pelo menos até agora, com maior poder de mobilização não assinou o pré-aviso de greve; aliás, está contra a greve.

O governo ameaçou com faltas injustificadas quem fizer greve e com processos disciplinares os enfermeiros que tenham entregue o título da especialidade, passado pela ordem, recusando a prestação de cuidados especializados e apenas disponibilizando cuidados gerais. É a guerra entre os sindicatos da UGT (SE e SIPE) e a Ordem dos Enfermeiros, controlados todos eles pelo PSD, e o governo do PS, apoiado pelo BE e PCP e, por extensão, pela CGTP, apostada na paz social a troco de umas míseras migalhas daquilo que os governo do PSD/CDS/Passos Coelho/Portas nos retiraram, a nós trabalhadores e, em particular, os enfermeiros. O governo do PS/Sócrates foi quem nos congelou a carreira e os vencimentos e prolongou o tempo e a idade para a aposentação - é bom não esquecer.

O SEP e o homólogo madeirense dão agora uma de "responsabilidade", estão em negociações com o governo e, segundo dizem, estarão em avançado estado de conclusão, embora ninguém saiba qual porque nada de concreto nos dizem. Agora, é a CGTP que fura a greve a pretexto das boas intenções do governo, fazendo lembrar os tempos do PREC de 1975 em que o apoio ao MFA e aos governos provisórios era assunto sagrado e inviolável. Agora, é a direita ressabiada, impedida de formar governo apesar do PSD ter ganho as eleições, que se aproveita do descontentamento de toda uma classe, mas de cujas razões de queixa também é responsável. Nos 4 anos e meios de governação laranja, o Azevedo e o Fernando Correia não se lembraram das reivindicações que agora tão afanosamente agitam.

É mais do que óbvio que os problemas de uma classe, tão prejudicada e explorada, estão a ser utilizados pelo PSD, que os seus caciques instalados na classe não hesitaram em usar os enfermeiros para os seus intentos, derrubar o governo, não se importando que alguns dos enfermeiros venham a ser sancionados disciplinarmente e até, eventualmente, em foro criminal, numa posição de força contra o PS e o Costa, já que a classe de enfermagem não passa para tal gente de carne para canhão. Não consta que em mais nenhuma classe sócio-profissional, no caso, maioritariamente assalariada no estado, tenha como dirigentes sindicais dois indivíduos reformados, na casa dos setenta anos, e que tenham feito a carreira toda, ou quase toda, no sindicato, bem longe dos doentes, com os quais agora também se dizem tão preocupados.

Os quatro sindicatos, putativamente representantes da classe dos enfermeiros, são, em primeira linha, os responsáveis pela divisão da classe, colocam sempre e acima de tudo as agendas dos partidos que os controlam, PSD e CDS, por um lado, e BE e PCP, pelo outro, os enfermeiros são simplesmente usados, daí estarmos na situação em que estamos. O que nos foi retirado foi graças à complacência sindical, e o pouquíssimo que nos foi restituído, sobretaxa de IRS, pagamento das horas complementares, é-nos apresentado como uma grande "vitória". O descongelamento da carreira é incerto, certeza é que não vamos ser recolocados em posição em que deveríamos estar caso a carreira nunca tivesse sido congelada; mas no próximo dia 13 de Outubro, segundo o Costa, já iremos saber que dinheiro é que o governo "tem" (eufemismo para designar o que é que sobrou dos muitos milhares de milhões que o governo tem entregue aos bancos e à clientela que vive de esmifrar o erário público) para os enfermeiros. O que nos (não) admira é que, em vésperas de preparação do próximo OE, a CGTP, como era habitual no tempo do governo anterior, não ter convocado ainda nenhuma luta, greve ou manifestação, e seja antes uma ordem profissional, que não tem poder legal para o fazer, a mobilizar um sector dos trabalhadores para o protesto.

Não há que ter ilusões em relação ao governo PS/Costa, não passa de uma versão soft do governo anterior PSD/Passos Coelho, os problemas para quem trabalha manter-se-ão, se o cinto está a ser aliviado (muito) ligeiramente se deve à boa conjuntura externa e à ajuda do BCE que se comprometeu a comprar dívida pública aos estados mais enrascados da UE até ao final do ano. O ataque aos enfermeiros sob o pretexto da "ilegalidade" da greve contrasta com a posição sobre a greve anunciada pelos juízes, esta sim ilegal na medida em que estes constituem um órgão de soberania - ainda iremos ver os ministros, ou os deputados, a fazer greve... porque estão a ser mal pagos. A partir de Janeiro de 2018, nada se sabe. O que se sabe é que os enfermeiros estão divididos e será luta que forjará a unidade tão necessária. Um sindicalismo revolucionário é cada vez mais necessário.

Quanto à greve desta semana, os enfermeiros devem fazê-la, contudo devem denunciar as manobras e as manipulações de que estão a ser vítimas.

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